Era uma vez uma bondosa princesa muito bonita, que vivia num reino muito distante.
Um dia, sem querer, a princesa deixou cair uma bola dentro de um lago.
Pensando que a bola estivesse perdida, começou a chorar.
— Princesa, não chore. Vou devolver a bola para você. — disse um sapo. — Pode fazer isso? – perguntou a princesa. — Claro, mas, só farei em troca de um beijo. A princesa concordou....
Então, o sapo apanhou a bola, levou-a até os pés da princesa e ficou esperando o beijo. Mas, a princesa pegou a bola e correu para o castelo. O sapo gritou: — Princesa, deve cumprir a sua palavra! O sapo passou a perseguir a princesa em todo lugar. Quando ia comer, lá estava o sapo pedindo a sua comida. O rei, vendo sua filha emagrecer, ordenou que pegassem o sapo e o levassem de volta ao lago.
Antes que o pegassem, o sapo disse ao rei: — Ó, Rei, só estou cobrando
uma promessa. — Do que está falando, sapo? Disse o rei, bravo.
— A princesa prometeu dar-me um beijo depois que eu recuperasse uma bola perdida no lago. O rei, então, mandou chamar a filha. O rei falou à filha que uma promessa real deveria ser cumprida. Arrependida, a princesa começou a chorar e disse que ia cumprir a palavra dada ao sapo.
A princesa fechou os olhos e deu um beijo no sapo, que logo pulou ao chão. Diante dos olhos de todos, o sapo se transformou em um belo rapaz com roupas de príncipe. Ele contou que uma bruxa o havia transformado em sapo e somente o beijo de uma donzela acabaria com o feitiço.
Assim, ele se apaixonou pela princesa e a pediu em casamento. A princesa aceitou. Fizeram uma grande festa de casamento, que durou uma semana inteira. A princesa e o príncipe juntaram dois reinos e foram felizes para sempre.
- 10 coisas que você não sabia sobre a relação entre o PT e o PSDB
PT e PSDB são os irmãos Karamazov da política nacional. Nas últimas décadas, ambos os partidos travaram duelos apaixonados e transformaram o debate público brasileiro num imenso caldeirão, um Fla-Flu. De um lado os azuis, do outro os vermelhos. De um lado o tucano, do outro a estrela. De um lado o professor, do outro o operário.
O que poucas pessoas sabem é que há mais coisas em comum entre o Partido dos Trabalhadores e o Partido da Social Democracia Brasileira do que julga nossa vã filosofia. PT e PSDB nasceram no mesmo lugar, no coração da esquerda paulistana, com concepções políticas e econômicas muito parecidas, e com duas figuras históricas – Lula e Fernando Henrique Cardoso – que não teriam ascendido sem o outro. E tudo isso nunca foi negado por seus criadores. Pelo contrário.
“Nós estamos que nem dois jogadores de futebol, somos amigos, somos até irmãos e estamos jogando em times diferentes”, já disse Lula sobre a relação entre os partidos.
“Nossas diferenças com o PT são muito mais em relação à disputa de poder do que sobre ideologia”, já assumiu Fernando Henrique Cardoso.
De fato, é muito difícil desassociar a história de ambos. O sociólogo francês Alain Touraine, de esquerda, ex-professor e amigo pessoal de Fernando Henrique, chegou a afirmar que o futuro do Brasil seria a união dos partidos. Em 2004, Touraine disse que os governos de FHC e Lula faziam parte de um mesmo projeto. E tal cenário é assumido por seu pupilo. Para FHC, há uma massa política atrasada no país e a polarização entre PT e PSDB serve para tirá-lo desse atraso.
“Os dois partidos que têm capacidade de liderança para mudar isso são o PT e o PSDB. Em aliança com outros partidos. No fundo, nós disputamos quem é que comanda o atraso”, disse.
Aqui, 10 coisas que você não sabia sobre a relação entre os dois partidos que mais pediram o seu voto nos últimos tempos.
Foi em 1978.
Fernando Henrique Cardoso era o príncipe dos sociólogos, um membro ativo da comunidade acadêmica paulistana que havia deixado a universidade para abraçar a vida pública. Era sua estreia de gala, o candidato de esquerda na corrida ao Senado pelo maior estado do país, a nova aposta do MDB.
Lula era o sapo dos operários, um líder do movimento sindical que tinha “ojeriza” à política partidária. Convencido por alguns amigos, abriu uma exceção para a candidatura do sociólogo do Morumbi. Pediu em troca sua adesão às bandeiras econômicas dos sindicatos, prontamente atendidas. Tal qual FH, era sua primeira vez nas corridas eleitorais. E a meta era clara: somar o máximo de votos possíveis para Fernando Henrique Cardoso.
Como conta o próprio Lula: “Acontece que em 78, primeiro ano das greves do ABC, o MDB estava lançando sua chapa de senadores. Algumas pessoas, alguns jornalistas cujos nomes não vou dizer, queriam que a gente apoiasse Cláudio Lembo, da Arena. Fui apresentado a Fernando Henrique Cardoso. Aí fomos para a campanha. Fui representar Fernando Henrique Cardoso em vários comícios.”
Lula levou FHC às portas de fábrica e rodou com ele pelo interior do estado.
Era o príncipe e o sapo unidos em torno da criação do mesmo reino – a maior figura daquilo que viria a ser o PSDB com a maior figura daquilo que viria a ser o PT. Num palanque do MDB, com artistas e figuras ilustres da esquerda paulistana, o líder operário irritou-se com a festividade. Virou-se para Ulysses Guimarães e esbravejou: “O trato é que iria pedir votos só para o Fernando Henrique Cardoso. Todo mundo sabe que sou o principal cabo eleitoral do Fernando Henrique Cardoso. Agora querem que eu peça votos também pro Montoro. Eu não vou pedir. Se não me deixarem fazer o que eu quero, eu desço e levo o palanque todo comigo, e vamos fazer o comício em outro lugar.”
Era o início de tudo. Fernando Henrique acabaria eleito primeiro suplente do senador Franco Montoro e, quatro anos depois, quando Montoro virou governador, assumiu a vaga, dando princípio à carreira política que o levaria ao cume do poder nacional. Sem o apoio de Lula em seus primeiros passos, nada disso seria possível.
Na década de setenta, Fernando Henrique Cardoso tinha uma casa de praia em Picinguaba, Ubatuba, litoral norte de São Paulo. Em 1976, entre as indas e vindas de sua vida acadêmica dentro e fora do país, deixou o imóvel nas mãos de um amigo de longa data que conhecia desde os tempos de garoto – um sujeito chamado Eduardo Matarazzo Suplicy. “Em 1976, aluguei uma casa em Paraty e fui conhecer Picinguaba. O Fernando Henrique Cardoso tinha uma casa lá, que acabou me emprestando por seis meses quando ele foi para a França. O filho da caseira me mostrou um terreno, onde acabei construindo minha casa, dois anos depois”, conta Suplicy.
Um ano depois, o fundador do PSDB abriria as portas para o fundador do PT e sua esposa – Lula e Marisa – passarem um final de semana no imóvel. Lula ficou extasiado com a paisagem. Só reclamou dos mosquitos.
No final da década de 1970, Fernando Henrique e Lula participaram de uma reunião no ABC paulista, com intelectuais e dirigentes sindicais, para discutir o que fazer diante da iminente redemocratização no país. Nesse espaço, discutiram a criação de um partido socialista. Mas a ideia não foi pra frente. Como conta o sociólogo Francisco Weffort, fundador do PT e posteriormente ministro do governo FHC: “Apesar das muitas afinidades, prevaleceu a divergência. Daquele grupo, uns saíram para criar o PT e outros, anos depois, o PSDB.”
Segundo Eduardo Suplicy, que reuniu Lula e Fernando Henrique diversas vezes em sua casa para discutir o futuro do país e a possível criação de uma nova legenda, ela só não nasceu pelo conflito de liderança entre os dois: “Cada um avaliava que seria o líder maior da organização que se formasse. Tinham dificuldade de aceitar a liderança um do outro, e ficava muito difícil para ambos ficar no mesmo partido”, conta.
Por muito pouco, PT e PSDB não se tornaram um único partido.
A história dos principais caciques tucanos se confunde com a história dos principais caciques petistas. Juntos, ajudaram a construir a esquerda brasileira.
Fernando Henrique Cardoso sempre foi um estudioso do marxismo, por influência de Florestan Fernandes. Na década de 50, auxiliava a edição da revista “Fundamentos”, do Partido Comunista Brasileiro. Também integrava um grupo de estudos dedicado à leitura e discussão da obra O Capital, de Marx. Em 1981, ao lado de Eduardo Suplicy, ingressou numa lista da Polícia Federal. Era tratado como comunista pela ditadura.
O economista José Serra foi uma das principais lideranças estudantis de seu tempo, presidente da UNE e um dos fundadores da Ação Popular, grupo de esquerda que revelaria os petistas Plínio de Arruda Sampaio e Cristovam Buarque. Serra é amigo pessoal e conviveu por anos no exílio com a economista petista Maria da Conceição Tavares, uma das principais influências intelectuais do Partido dos Trabalhadores e referência particular de Dilma.
O tucano Aloysio Nunes, vice de Aécio Neves na última eleição, foi membro da Ação Libertadora Nacional (ALN), organização guerrilheira liderada por Carlos Marighella – era seu motorista e guarda-costa. Aloysio realizou inúmeros assaltos à mão armada em nome da revolução socialista.
José Aníbal, uma das figuras mais proeminentes do PSDB paulista, foi amigo de adolescência de Dilma Rousseff, com quem estudava matemática depois das aulas, e seu parceiro na Organização Revolucionária Marxista Política Operária, também conhecida como POLOP. Aníbal foi um dos fundadores do PT, antes de ser presidente do PSDB.
Juntos, eles fundariam os dois partidos políticos mais relevantes do país.
O recém formado PSDB, criado por dissidentes de esquerda do MDB, lançou o senador Mario Covas candidato à presidência em 1989. Covas alcançou pouco mais de 7 milhões de votos no primeiro turno e terminou a corrida na quarta colocação. O que pouca gente se lembra é que o PSDB apoiou Lula no segundo turno – o PMDB, de Ulysses Guimarães, tentou seguir o mesmo caminho, mas acabou rejeitado pelo Partido dos Trabalhadores. Os tucanos, por outro lado, foram acolhidos. Em almoço com o prefeito de Belo Horizonte eleito pelo PSDB, Pimenta da Veiga, Lula ouviu do tucano: “Eu tenho também a alegria de saber que, pela primeira vez, aqui se reúnem representantes de todas as forças progressistas do país, nesta tarde, neste almoço. Eu estou certo que isso terá desdobramentos. E acho que deve ser assim, porque o Brasil deseja mudanças em profundidade. E só essas forças progressistas podem fazer essas mudanças.”
Lula perderia a eleição para Collor em poucas semanas.
Em 1993, o Brasil passou por um plebiscito sobre a forma e o sistema de governo do país. De um lado, o PT articulava a formação de uma Frente Presidencialista. De outro, o PSDB defendia a implementação do parlamentarismo. Numa conversa informal, Lula e FHC chegaram a conversar sobre um plano em que o operário se tornaria presidente e o sociólogo primeiro-ministro.
Em 1998, como revela numa conversa com o ex-senador petista Cristovam Buarque, FHC recebeu Lula no Palácio do Alvorada e arriscou uma nova previsão. “Cristovam Buarque: Em novembro de 1998, acompanhei o Lula para visitá-lo. Quando o senhor abriu a porta do apartamento residencial no Alvorada, disse: “Lula, venha conhecer a casa onde você um dia vai morar”. Foi generosidade ou previsão?
Fernando Henrique Cardoso: Não creio que tenha sido uma previsão, mas sempre achei uma possibilidade. E também um gesto de simpatia. Eu disse ao Lula naquele dia: “Temos uma relação de amizade há tantos anos, não tem cabimento que o chefe do governo não possa falar com o chefe da oposição”. Era uma época muito difícil para o Brasil. Eu disse lá, não sei se você se lembra: “Algum dia nós podemos ter de estar juntos”. Eu pensava numa crise. E disse ao Lula: “Não quero nada de você. Só conversar. É para você ter realmente essa noção de que num país, você não pode alienar uma força”. Lula conversou comigo no dia da posse. E foi bonita aquela posse… Na hora de ir embora, o Lula levou a mim e a Ruth até o elevador. E aí ele grudou o rosto em mim, chorando. E disse: “Você deixa aqui um amigo”. Foi sincero, não é?”
Em 1999, Fernando Henrique relatou o quanto respeitava Lula. Numa conversa com Eduardo Suplicy, revelou que quando Lula aparecia na televisão falando mal dele, simplesmente desligava o aparelho. “Fico triste, perco até o humor. Para vocês terem uma ideia do quanto eu gosto e admiro o Lula. Você sabe, Eduardo, o que eu fiz com Lula quando ele esteve comigo no Alvorada, mostrei a ele o meu quarto e disse: “Um dia isso aqui vai ser os seus aposentos”. A gente faz isso com adversário, nem com todos os amigos a gente faz isso. Pois eu mostrei a Lula as dependências da residência oficial em que moro. Mostrei o meu quarto.”
Em três anos, Lula viraria presidente. A profecia tucana se cumpriu.
Nas eleições de 2002, FHC retaliou José Serra, candidato pelo PSDB à sucessão presidencial, por ataques feitos a Lula durante a campanha. Fernando Henrique disse também, em conversas reservadas, que foi um erro o ataque direto ao presidente do PT, o então deputado federal José Dirceu. Dirceu era o petista mais próximo de seu governo e a ordem era que se suspendesse imediatamente as críticas a ele. Seu puxão de orelha foi transmitido ao comando do marketing da campanha de Serra.
Com Lula eleito, FHC iniciou uma campanha secreta em sua defesa. A história é narrada no livro ”18 Dias — Quando Lula e FHC se uniram para conquistar o apoio de Bush”, escrito por Matias Spektor, doutor em relações internacionais pela Universidade de Oxford e colunista da Folha de São Paulo. Como conta Spektor: “Lula despachou José Dirceu [que viria a ser o chefe de sua Casa Civil] para os Estados Unidos e acionou grupos de mídia e banqueiros brasileiros que tinham negócios com a família Bush. Disciplinou as mensagens de sua tropa e abriu um canal reservado com a embaixada americana em Brasília. Lula não fez isso sozinho. Operando junto a ele estava o presidente brasileiro em função – Fernando Henrique Cardoso. FHC enviou seu ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, em missão à Casa Branca para avalizar o futuro governo petista. O presidente também instruiu seu ministro da Fazenda, Pedro Malan, a construir uma mensagem comum junto ao homem forte de Lula, Antonio Palocci.
Eles fizeram uma dobradinha para dialogar com o Tesouro dos Estados Unidos, o Fundo Monetário Internacional e Wall Street. Fernando Henrique ainda orientou Rubens Barbosa, seu embaixador nos Estados Unidos, a prestar todo o apoio a Lula.”
Sem esse apoio, Lula certamente não conseguira a estabilidade internacional que teve. Não fosse FHC, sua história teria tomado outros rumos. E a do Brasil também.
No início dos anos 2000, Henrique Meirelles deixou de lado uma vida bem sucedida como executivo do setor financeiro para candidatar-se a deputado federal por Goiás. Recebeu 183 mil votos e se tornou o deputado mais votado do estado. Seu partido era o PSDB. Com o sucesso eleitoral e o respeito do mercado financeiro, foi convidado por Lula para ser o primeiro presidente do Banco Central de seu governo, cargo que ocuparia por longos 7 anos. Meirelles ainda receberia as bençãos de FHC, antes de se desfiliar do PSDB e deixar o cargo que havia sido eleito. Lula telefonou para Fernando Henrique para avisar a escolha.
Em 2003, Marcos Lisboa, outro homem forte da economia do primeiro governo Lula, declarou que a equipe econômica do governo Fernando Henrique Cardoso merecia uma “estátua em praça pública” por ter promovido os acordos com os governos estaduais e municipais na negociação da dívida e também por ter criado a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Anos mais tarde, Fernando Henrique revelou comemorar as conquistas do governo Lula. “Eu também comemoro a melhoria na distribuição de renda. A política dele é a minha”, disse.
Durante todo governo Lula, duas figuras construíram uma ponte entre o presidente operário e o ex-presidente sociólogo: os então ministros Antonio Palocci, da Fazenda, e Márcio Thomaz Bastos, da Justiça. Os encontros foram confirmados por ambos – Palocci confirmou que esteve pessoalmente com FHC “pelo menos cinco vezes”; Bastos disse ter conversado pessoalmente com o ex-presidente apenas uma vez, em junho de 2005, mas confirmou que os contatos por telefone eram muito frequentes. Lula sempre soube das conversas e, mais de uma vez, em momentos difíceis, sugeria a Palocci: “Vai conversar com Fernando Henrique”.
Em 2005, no auge do escândalo do Mensalão e com a pressão por impeachment, Lula orientou seus dois homens fortes para pedirem a FHC que aplacasse os ânimos da oposição. O tucano aceitou de prontidão. Na conversa com Thomaz Bastos, FHC concordou que um impeachment de Lula, à época uma ameaça real, “tornaria o país ingovernável”. Fernando Henrique dizia que não queria criar “uma cisão no Brasil”. Os tucanos acataram a ordem e a história do impeachment perdeu força.
PT e PSDB são tratados como antagonista no cenário político nacional, mas a verdade é que em pelo menos 999 cidades (o correspondente a 18% das 5.569 cidades brasileiras), os partidos fizeram parte da mesma coligação nas últimas eleições municipais. Só no estado de São Paulo, esse número foi de 54 municípios.
Em Schroeder, Santa Catarina, por exemplo, o prefeito eleito foi o tucano Osvaldo Jurck; seu vice foi o petista Moacir Zamboni. Em 149 casos, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as chapas que contaram com o PT foram encabeçadas por candidatos a prefeito pelo PSDB.
Tudo como se fossem feitos um para o outro.
Este texto deve, por certo, desagradar algumas pessoas, mas como não me importa agradar e sim alertar, vou correr esse risco.
Assusta-me ver pessoas marchando pelas ruas empunhando cartazes pedindo uma intervenção militar, a maioria agindo inocentemente, convencida de que a ditadura em nosso país foi um período maravilhoso e que era necessária para salvar-nos da eterna “ameaça comunista”. Vejo algumas pessoas mais maduras seguirem esse mesmo embalo, talvez porque fizessem parte daquela minoria bem nascida que nunca teve problemas para comprar o que bem quisesse, ou talvez porque foram formados nas escolas infestadas da bactéria do militarismo e não se preocuparam em conhecer a história quando a ditadura enfim acabou.
Os mais jovens por certo não viveram esse período, no qual tive a oportunidade de passar minha infância adolescência e até mesmo o início de minha vida adulta. Nunca estive envolvido com a luta armada e nem tinha uma visão política da realidade, como boa parte dos brasileiros que procurava sobreviver e levar sua vida. Na verdade éramos uma sociedade submetida a uma verdadeira lavagem cerebral, obrigados a saber na ponta da língua todos os hinos marciais, com a desculpa de aprendermos música, e a idolatrar todos os heróis militares que nos pudessem empurra goela abaixo.
A imprensa era impedida de noticiar qualquer coisa negativa sobre o regime (bem diferente de hoje em dia) e os “inocentes” álbuns de figurinhas eram cheios de palavras de ordem e propaganda militarista. Foi a época áurea de Don e Ravel, que só fizeram sucesso nessa época, cantando loas ufanistas ao Brasil. Foi também a época áurea da EXPOEX- Exposição do Exército que pretendia incutir nos jovens o desejo de tornar-se soldado. As escolas montavam excursões para ir até elas.
A ditadura foi combatida em várias frentes, desde a luta armada até à resistência pacífica e cultural, bem como por vários exilados políticos que a combatiam de fora do país.
É claro que me causa horror ver alguns “artistas” de hoje, conscientemente ou não, reproduzirem o discurso do medo que ecoou nos idos dos anos 60. Claro que me causa espanto ver pessoas anônimas de bem, caírem no conto da ditadura branda.
Pior do que isso me causa náuseas, ver pessoas usarem de uma liberdade de expressão para justamente dizerem que não temos liberdade de expressão. É muita ignorância ou preguiça de pensar. Afinal, se estivéssemos impedidos de nos expressarmos, em qualquer grau de censura, essas mesmas pessoas já estariam presas há muito tempo. Queria ver essas pessoas, que tem horror à democracia, falarem um centésimo do que dizem sobre o governo atual, se fosse algum general que lá estivesse.
Por certo a sua valentia acabaria em segundos.
Pior do que isso é ver as mesmas forças “de direita” usarem os mesmos argumentos que levaram Getúlio Vargas ao suicídio, para tentar nos enfiar goela abaixo uma nova ditadura.
Pior ainda é ver partidos políticos, emitirem notinhas sem sentido, fingindo não concordar com o caos que se está instalando, simplesmente porque pretendem levar vantagem com isso.
Mas, um partido político que abriga em seu cerne, descendentes de ministros da ditadura e de famílias tradicionais, acostumados a mandar e desmandar sem serem contrariados, só pode mesmo fingir-se de inocente neste momento.
Para alguns desses senhores um golpe militar apenas serviria para garantir seus direitos de propriedade e riqueza, não conquistados pela meritocracia que tanto apregoam, mas por herança.
Não, não estou pregando nenhuma guerra de classes, esse é outro discurso batido e sem sentido, estou apenas dizendo que para “meia dúzia” de políticos fracassados, um novo golpe militar seria uma redenção, uma volta às capitanias hereditárias das quais não querem abrir mão.
As pessoas vivem repetindo frases do tipo: Mostre-me um país onde o comunismo de certo!
Pois bem, eu faço outra pergunta: Em que país um regime militar deu certo?
O mais incrível é que, em tempos de internet, onde se pode facilmente tomar conhecimento do que ocorreu na ditadura militar, as pessoas se neguem o direito de pesquisar e conhecer a história deste país. Parece-me inconcebível que educadores não procurem conhecer a história de Paulo Freire e Anísio Teixeira. Que estudantes de jornalismo não se importem em conhecer sobre a morte de Vladimir Herzog...
Enfim: Um povo que não conhece sua história está fadado a repetir os mesmos erros do passado. - Jorge Linhaça
- Patriotismo ou Ilusionismo?